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Caso Clínico #1 - Órteses para Fraturas em Crianças 

  • Foto do escritor: Mundo da TO
    Mundo da TO
  • 16 de jan. de 2020
  • 7 min de leitura

Ooooooi meus queridos

Primeiramente, um Feliz Ano Novo para todos, que 2020 seja um ano de mto trabalho, mta batalha e mtas vitórias e conquistas para todos nós. Primeiro post do blog do ano e como prometido no meu instagram, hoje eu vim contar para vocês do primeiro caso de órtese do ano, foi um caso muito interessante onde temos diversos assuntos para tratar. E antes que você pense que é somente sobre a órtese do paciente, já te adianto: a órtese foi apenas um dos tópicos, eu vou falar como Terapeuta Ocupacional de uma forma geral e ampla, para vcs entenderem como o nosso trabalho não pode nunca ser reducionista. Então vamos lá. Chegou para mim esse caso de um pacientinho, uma criança de 2 anos, com fratura de rádio distal. A mãe estava bem preocupada e tinha uma urgência absurda pela confecção da órtese. Fiz um encaixe e fui atendê-los, calculei uns 40 minutos para confeccionar a órtese, já que na minha cabeça, seria um cock up, um posicionamento de punho simples.

Chegando na casa deles, a mãe começou a me contar a história do seu filho e já de cara, percebi que não seria um caso simples. Nosso querido pacientinho de apenas 2 anos teve, nos últimos tempos, 6 otites, uma inflamação bem séria nos ouvidos e devido a tanta secreção, inflamação e infecções repetidas, ele acabou sofrendo uma obstrução dos canais auditivos e se tornou surdo. Este tipo de surdez é reversível, mas ele precisava passar por uma cirurgia para desobstruir o canal auditivo e colocar uma espécie de tubinho para que pudesse voltar a ouvir. A cirurgia estava marcada para o dia seguinte da confecção da órtese, e por isso a urgência pelo dispositivo. Ela queria maior conforto pro filho e menos preocupações, por exemplo, ao ter que dar banho no pequeno. Imagina só, ter que tomar o maior cuidado com os ouvidinhos recém operados e ainda, cobrir o gesso, pesado, com pouco mobilidade....enfim, seria mais complicado e por isso fizemos a órtese com urgência. Sobre a fratura, ela me contou que ele estava vendo desenho com amiguinhos, sentado em um banco sem encosto, daqueles de madeira de sítio, sabe? Se desequilibrou e caiu em cima do braço. Acontece, claro, ainda mais com crianças que nunca param quietas, não é mesmo? Bom, como de praxe, pedi alguns exames de imagem para saber o que havia acontecido de fato no membro superior dele, pois quando bati o olho, notei que a tala gessada estava imobilizando também o cotovelo e passou pela minha cabeça que pudesse ser mais que somente uma fratura de rádio. Peguei o raio x e constatei que estava certa. Olhem o estrago que a pequena queda acarretou ao nosso príncipe:

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Numa fratura como esta, de rádio e ulna distal, é muito comum que haja um desalinhamento na articulação radio-ulnar distal. E quando isso acontece, o complexo da fibrocartilagem triangular também é afetado. Pra quem não sabe, o complexo da fibrocartilagem triangular é uma estrutura composta por cartilagem e ligamentos, e que tem por função a estabilização do punho, mais especificamente, a articulação entre o rádio e a ulna na sua porção distal. O antebraço é o segundo segmento corporal que mais sofre fraturas, perdendo somente pra tíbia. Essas fraturas de antebraço são lesões muito comuns em crianças e somam cerca de 40% de todas as fraturas pediátricas. No caso do meu paciente, o tratamento indicado foi o conservador, que realmente é a melhor opção quando as fraturas não tem desvio ou então apresentam pequeno desvio. Na crianças, é uma excelente opção já que elas apresentam altíssimo potencial de remodelação óssea. No caso dele, foi feita uma redução fechada da fratura e ele ficou imobilizado por 4 semanas com tala gessada axilo palmar, imobilizando também o cotovelo. Normalmente entre 6 e 8 semanas a tala ou no caso a órtese é retirada para que a gente comece a reabilitação com alongamentos, mobilização ativa e passiva bem leve, começando sem resistência e depois aumentando aos poucos a intensidade dos exercícios (normalmente após 8 semanas). O retorno do arco de movimento e às funções normais é esperado após cerca de 6 a 9 meses, o que em crianças pode ser mais precoce e realmente é. As crianças se recuperam sempre com maior facilidade. Pensando então nessa lesão que ele teve, nesse tipo de fratura, mudei o modelo de órtese para confeccionar para ele. Não poderia ser um cock up regular, teria que ser uma órtese circular, que popularmente chamamos de sanduíche, que é uma órtese dorsal ventral que se estende aos epicôndilos, no cotovelo, bloqueando a pronação e a supinação, mas libera a flexão e extensão do cotovelo. Sempre que isso acontece, que eu preciso modificar o modelo da órtese, eu entro em contato com o médico responsável. Mandei mensagem para o médico (para não atrapalhar com ligação, caso ele estivesse em consulta) e ele de prontidão me respondeu que não havia tido lesão da fibrocartilagem triangular, mas que sim, ele concordava em ser uma órtese sanduíche para maior proteção do paciente (no caso por ser criança, melhor pecar pelo excesso de proteção do que pela falta, né). E além disso, bloquear a prono-supinação, pelo menos por enquanto, seria interessante para que a consolidação óssea se completasse. Bom, saindo um pouco da anatomia e da reabilitação em si, voltando ao atendimento, a mãe me contou também que já havia passado por 5 neurologistas, sendo que 4 deles levantaram a hipótese do filho ser autista. O último médico neuro pela qual eles passaram pediu que primeiro fosse feita a cirurgia dos ouvidos e que fosse reestabelecida a audição para verificar se realmente o diagnóstico de autismo seria fechado. Por que? Segundo a mãe, o comportamento dele foi mudando conforme ele foi perdendo audição. Ele sempre foi acompanhado por otorrinos e neuros e o próprio otorrino relatou que já teve casos como este: assim que se reestabelece a audição, a criança passa a ter comportamento mais dentro da normalidade, e os padrões de comportamento que levavam a pensar no autismo, desaparecem. Particularmente, vou confessar para vocês: foi a primeira vez que atendi um caso assim. Não costumo atender autismo ok? Com todas essas informações, vocês conseguem imaginar como foi o atendimento? Como foi retirar a tala gessada, como foi confeccionar uma órtese com material quente num bracinho pequenininho, frágil, ainda dolorido, depois de 4 semanas de gesso? Como se comunicar com uma criança que ainda não fala mas que também não ouve com clareza? E a mãe? Como lidar com tantas perguntas, ansiedade, angústia da situação na qual o filho dela se encontra? Pois é meus queridos, nem todos os atendimento saem como esperamos. O meu cálculo era ficar com eles cerca de 40 minutos, lembram? Fiquei na casa deles por 2 horas e meia. A órtese foi confeccionada com sucesso, conversamos muito, brinquei bastante com ele e expliquei cada detalhe para a mãe, que ficou muito mais aliviada após o atendimento. O que eu quero trazer para vocês com esse vídeo é que a gente não pode se restringir a ir na casa do paciente, fazer uma órtese e ir embora. Não! Este não é o meu trabalho! Este não é o NOSSO trabalho. Precisamos olhar com cuidado para cada caso, elaborar um raciocínio clínico específico para aquele caso que estamos atendendo. Modificar condutas, conversar com outros profissionais, trocar informações e principalmente, OUVIR o que o paciente e o familiar tem pra nos dizer. Fiquei um bom tempo para ganhar a confiança do pequeno, brincamos, até que ele se aproximasse espontaneamente, chegasse pertinho, subisse no meu colo. Brinquei com os brinquedos dele, no espaço dele até que ele me deixasse entrar no seu mundinho. Enquanto isso, a panela já estava na bancada com a água quente e o material já estava devidamente cortado, somente aguardando o momento certo para a confecção. O momento da confecção não foi fácil. Ele chorou, tentou tirar o braço, tive que retornar à panela algumas vezes, mas com jeitinho, deu tudo certo. A mãe foi maravilhosa também, colaborativa, compreensiva e senti que ela ficou confortada com todas as explicações. Para resumir e finalizar este vídeo, eu tenho algumas dicas para dar para vocês. Aí vai: 1) Elabore com calma seu raciocínio clínico do caso que está atendendo e faça isso com calma. Não tenha pressa! Mesmo que demore um pouco mais de tempo para terminar o atendimento. O importante é sempre ter a melhor conduta para cada caso de forma particular e com muita propriedade do que se está fazendo. 2) Organize seu “cantinho” com os materiais das órteses e deixe tudo bem preparado somente aguardando o melhor momento para realizar a confecção de fato. 3) Certifique-se de que o modelo da órtese é o correto para aquele caso. Se tiver dúvidas, ligue para o médico, fale com outros profissionais, veja os exames de imagem. Tenha a certeza de que está fazendo o melhor para aquele caso. 4) Somente retire as talas gessadas quando perceber que chegou o momento de confeccionar a órtese. Não tire antes do tempo para que o membro do paciente não fique desprotegido por muito tempo. Não arrisque novas lesões. 5) No caso de crianças, fale com os pais para que não deixem que os filhos corram ou pulem no período entre a retirada da tala gessada e a confecção da órtese. Mais uma vez, não arrisque que a criança bata o membro ou caia novamente sobre o membro. 6) Confeccionar órteses para crianças normalmente é mais difícil do que para adultos. As mãos são muito pequenas e, via de regra, as crianças são mais agitadas, se assustam com mais facilidade. Para facilitar o seu atendimento, explique aos pais cada passo da confecção e ganhe a confiança deles e da criança para que a confecção seja a mais tranquila possível. 7) A pele das crianças, assim como a de idosos, são mais fininhas e mais sensíveis. Tenha sempre malha tubular para proteger a pele deles e para que eles sintam menos o calor do material e se assustem menos. 8) Peça ajuda dos pais ou cuidadores para segurar o membro onde será confeccionada a órtese. Explique como quer que seja posicionado e mostre como devem segurar. 9) Caso a criança comece a chorar, peça para os pais acalmarem a criança como já fazem de costume. Eles sempre saberão melhor como distrair e consolar o filho deles do que nós. 10) Ouça o que os pais tem a dizer. Responda todas as perguntas que eles fizerem com calma, com sinceridade e sempre tentando consolar as angústias que eles trouxerem. Coloque-se no lugar desta mãe e seja mais gentil do que de costume. Ufa! Que caso bacana, não é mesmo? O que vocês acharam? Gostaram? Ficaram com dúvidas? Entre em contato comigo através do canal no Youtube, meu instagram, meu facebook, meu site, meu whatsapp, enfim, utilize qualquer um desses canais de comunicação e venha trocar idéia comigo. Mande suas perguntas que sempre estarei à disposição para respondê-las. Espero, de coração, que vcs tenham gostado e que continuem por aqui.


Confiram o resultado da órtese:


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